A discussão gerada pelo uso do termo "Shekinah" por segmentos evangélicos (músicas, ministérios, etc...) e em geral (lojas maçônicas, esoterismo, cabala mística, etc...), tendo cada um dos diversos segmentos o seu próprio entendimento, me leva a discorrer sobre as questões hermenêuticas (Hermes era o deus mensageiro do panteão grego, que transmitia a mensagem de Deus aos homens; logo, hermenêutica é arte de transmitir mensagens ENTENDÍVEIS aos homens - ciência do entendimento, teoria geral da compreensão) do termo.
Primeiro, vamos historificar o termo: sim, é verdade: os xiitas léxicos tem razão: em nenhum lugar da Bíblia se encontra este termo. O termo foi cunhado por rabinos, para significar a habitação ou a presença de Deus no meio do povo. Ora, então como que, para os evangélicos, no mundo todo, o termo passou a significar a Glória de Deus? Simples, usando-se uma figura de linguagem. Existe uma figura de linguagem chamada: Metonímia e um tipo específico de metonímia nos chama a atenção para este nosso caso que é a: Sinédoque, que consiste na atribuição da parte pelo todo ou do todo pela parte. Tudo bem até aí? Espero que sim. Então, analisemos dois textos: 1. "Uma vez dentro Moisés da tenda, descia a coluna de nuvem e punha-se à porta da tenda; e o SENHOR falava com Moisés. Todo o povo via a coluna de nuvem que se detinha à porta da tenda; todo o povo se levantava, e cada um, à porta da sua tenda, adorava ao SENHOR." (Ex 33:9-10 - ARA). Ora, a coluna de fogo estava à tenda congregação. A tenda da congregação, depois que os Rabinos cunharam o termo, passou a ser a "Shekinah". Havia muitos utensílios ali, mas por sinédoque, a tenda da congregação poderia ser conhecida apenas pela coluna de fumaça (que é a Glória visível de Deus), logo, "Shekinah" é a Glória de Deus. 2. outro texto, conhecido do grande público, é: "No ano da morte do rei Uzias, eu vi o Senhor assentado sobre um alto e sublime trono, e as abas de suas vestes enchiam o templo." (Is 6:1 - ARA). Neste texto então fica facinho, facinho entender a "Shekinah" como glória de Deus. As abas das vestes enchiam o templo. A presença do Senhor enchia o templo. O templo, por sua vez é a habitação do altíssimo no meio do povo. Então os dois temos ligados a "Shekinah" estão ali, presença e habitação... Só tem um porém, foi uma VISÃO! Diz o profeta: "...eu vi o Senhor...". Então era uma presença visível, uma Glória visível, logo, somos mais uma vez remetidos por sinédoque ao entendimento que "Shekinah" é a Glória visível de Deus. Estes são apenas dois textos que reforçam o entendimento e a aceitação de que o conceito da "Shekinah" seja, para os evangélicos de um modo geral, a Glória visível de Deus. Resumindo: Em diversas crenças existem diferentes significados, mas o conceito da "Shekinah", usado e aceito no meio evangélico é o de que a "Shekinah" é a glória visível de Deus.
Mas, quando nos aprofundamos nas questões hermenêuticas, vemos que uma verdade (no caso, um termo qualquer, de qualquer idioma) aplicada à sua vida, à sua verdade, gera uma terceira verdade, que é o seu próprio conceito. "Shekinah" é um bom exemplo disto: o termo original usado pelos rabinos tinha identidade com a habitação de Deus e/ou a presença de Deus no meio do seu povo; porém, se você usar o termo "Shekinah" perante (a verdade de) um evangélico e perante (a verdade de) um esotérico, por causa de suas percepções distintas da verdade, cada um terá um entendimento distinto, que aliás, nada a tem a ver com a verdade original. Agora, isto é muito diferente de pensar, como alguns xiitas que conheci os textos, que quando cantamos: "derrama a sua 'Shekinah' sobre nós" estamos evocando demônios ("Shekinah" seria outro nome de Lilith, a mãe dos demônios, na cabala mística) ou pedindo para uma casa cair sobre nossas cabeças (já que "Shekinah" é "habitação"). Quando você usa um termo, o que importa é o significado daquele termo para você, para a sua verdade, dentro dos cenários e do contexto em que é usado.
Para exemplificar este conceito, recorro à evangelização da Coréia. A evangelização da China foi terrível; só Hudson Taylor, após a guerra do ópio, é que tentou dar um jeito naquilo...Mas isto aconteceu por que os evangelistas quiseram ensinar aos chineses um novo Deus, com um novo nome (afinal de contas, os nomes chineses para Deus só poderiam dizer respeito a deuses pagãos e heréticos...). Na Coréia, os evangelistas perguntaram: qual o nome de Deus (o engraçado é que o panteão coreano até então era semelhante ao chinês; o que aconteceu foi que os evangelistas aos coreanos foram mais espertos...)? O nome de Deus é este: e saiu um nome esquisito em coreano. Eles, os evangelistas, não se apegaram a ensinar Jeová, ou Javé, ou coisa parecida aos coreanos. Explicaram que conheciam a história daquele Deus, pregaram a Jesus, chamando Deus como os coreanos o chamavam e depois acrescentaram os demais nomes da divindade. Como os coreanos conheciam o conceito de Deus relacionado ao nome que eles usavam, foi amplamente aceito o evangelho na Coréia. Penso que, se os primeiros evangelistas que chegaram lá, apregoassem a Jesus, chamando Deus por um nome com o qual os coreanos não estivessem acostumados ou não tivessem identidade, não teriam a aceitação que tiveram. Lembrando que na Coréia, o cristianismo histórico experimentou um crescimento do número de fiéis de oitenta por cento ao ano...
Fica difícil para alguém que possui entendimento literal, xiita, aceitar conceitos. Tem ministros de louvor, de movimentos jovens, que podem conclamar a assembléia dizendo: "Aí, galera de Jesus!"; já num movimento ortodoxo, chamar a rapaziada de galera é lançar maldição, pois galera significa, na visão dos membros desses movimentos, "bando de salteadores"... Viu como são as palavras? Elas só tem entendimento dentro do cenário e contexto em que são empregadas. Palavras, são só palavras. O que importa é o entendimento (hermenêutica) daquela palavra, o conceito que ela exprime, dentro de determinado contexto e cenário.
Concluo, desta forma, que o entendimento do conceito da Shekinah, como sendo a presença visível de Deus, dentro do meio evangélico é amplamente aceito e deve continuar a ser usado.
Ficou grande, mas, espero elucidativo.
Beijos e abraços,
Alf.
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